domingo, 7 de novembro de 2010

Construindo a Cantina Comunitária



Fiquei na aldeia todos os dias em que estive em Angra, claro que ao entardecer eu voltava para a casa de minha mãe.

Ajudava a todos da maneira como eu podia e dentro de minha possibilidade. No início eu passei a levar roupas e a ajudar somente a família de Rosa, afinal eram muitos, e eu sozinho não dava conta.

Os anos foram passando e eu mais e mais me achegando a todos. Diante de idas e vindas eu fui observando o tamanho da necessidade deles, mas como eu era um só, fui priorizando tudo o que fazia e para quem fazia.

Certa vez cheguei na aldeia com um peso enorme, um bolsão cheio de roupas. Eram e ainda é uma média de quase cinco quilômetros da casa de minha mãe até a Aldeia, e eu havia feito isso tudo a pé.

Naquele momento quando eu chegava perto do campo de futebol que ainda era perto da casa de reza, percebi um movimento estranho das pessoas da Aldeia, entre elas um índio chamado Domingos. Esse mais tarde viria a ser mais que um irmãozinho pra mim. Eles me pareciam furiosos nervosos e sei lá chateados. De longe percebi que eles cavavam uns buracos do tipo que fazem os pedreiros quando vão construir uma casa. Ao chegar mais perto eu pude ver que era realmente isso que acontecia, mas algo estava errado. Por não ter muita intimidade pensei em passar direto e seguir meu caminho até a casa de Rosa, mas minha curiosidade falou mais alto e eu decidi encarar a situação e me achegar a eles. Já estava indo na aldeia a coisa de dois anos, era hora de eu me enturmar.

Joguei meu sacolão no chão e entrei no meio da conversa. Ao dar bom dia na língua deles perguntei o que houve. Domingos então tomou a frente e me explicou que surgiram uns caras na aldeia que eram de uma Universidade que não vou dizer qual aqui, mas fato é que eles chegaram na aldeia com um projeto de construção de casas de bambu. Na verdade os caras estavam era fazendo uma monografia, uma tese sobre o que estudaram e foram na aldeia colocar isso em prática. Para ganhar confiança do povo prometeram e não cumpriram fazer uma maquete tamanho real , para eles, pelo contrário fizeram a parte que coube a eles para conclusão dos estudos e bye, bye. Sumiram. Fiquei indignado com a situação, pois eles estavam ali com cimento, areia, tijolos e os caras se mandaram.

Falei ao Domingos que ao contrário deles eu nunca prometi nada, e até hoje não prometo, se vou fazer vou e faço. Pedi a ele meia hora pra ir até a casa de Rosa levar as coisas e que voltaria para ver o que podia ser feito para remediar o estrago deixado pelos outros irresponsáveis. O que me irrita é que só porque são índios não quer dizer que o tratamento que deve ser de igual para igual com eles tem que ser diferentes.

Depois de meia hora como combinado, voltei e disse que iria pegar firme com eles, mas que eu só podia ficar até um dia antes da minha volta para o Rio.

Arregacei a camisa e caí dentro. Os anos de trabalho de ajudante de pedreiro com meu padrasto ali ia fazer a diferença. Corrigi os erros e partimos para a massa, claro que eu fiquei ensinando, pois a toda hora um vinha e queria mexer. Quando necessário, eu tomava as rédeas da situação e corrigia os erros.















Era muito engraçado pois eu ali naquele momento agia com tanta liberdade que parecia ser indio. Fiquei tão metido a falar guarani que as mulheres e crianças logo ficaram a volta. Para eles era festa ter um branco ali com eles, é disso que eles clamam que vá alguém e os ajude, os ensine. Eles não querem esmola de ninguém, mas querem conhecimento, querem aprender. Eu lhes passava um pouco do que eu sabia somente isso. Mas esse pouco estava sendo de grande valia. O bacana nesse dia foi que eu ganhei meu nome em guarani. APEAPETÓ,não é a escrita correta mas é pra quem ler, ler como se pronuncia. Só não dou a tradução, pois descobri que é um palavrão. Depois de dias ali trabalhando é que eu fui entender o porquê de quando eu sempre pedia uma ferramenta e eles diziam: - não, esta ferramenta não chamar assim, chamar Apeapetó.- E assim ficou meu nome. Cambachi foi quem me batizou.

Bom voltando a relatar sobre a construção. Nós estávamos tão empenhados no trabalho que íamos até a noite, com isso o Ernesto, o motorista da Toyota é quem me levava em casa. (Ernesto era um índio que se tornou um grande amigo. Hoje não mora mais na aldeia, se for permitido eu depois conto sua história).



Fiquei por quase um mês na aldeia, trabalhando na construção da cozinha comunitária.
Foram dias maravilhosos onde eu pude conhecer mais aquelas pessoas e saber mais de sua cultura. Eu não perdi tempo estando ali, pelo contrário, a cada dia eu ganhava conhecimento estando junto deles.



Quando as primeiras paredes foram sendo erguidas é que eles puderam ver que o esforço estava valendo a pena e era gratificante fazer isso.



Não éramos profissionais, mas a verdade e o que interessava realmente era de que estava acontecendo e isso era muito importante para aquelas pessoas.









Essa parede ao fundo foi escolhida para que qualquer um que desejasse assentar um tijolo era nela que ele ia fazer isso. Foi a mais torta de todas, mas esta de pé até hoje.







Os dia foram passando, o tempo as vezes não colaborava. Às vezes chovia, às vezes ficava uma garoa fininha e nesses dia eu não subia. Eram os piores dias pra mim, e até hoje é assim. Quando vou a Angra dos Reis só penso em estar lá com eles.

















Infelizmente pelo tempo não ter ajudado, chegou o dia de eu voltar para a minha realidade. Deixei a casa nesse ponto. Quando voltei, meses depois já estava concluída. Mas todos até hoje falam da construção dela com muito carinho porque muitas coisas boas aconteceram ali no decorrer da mesma. Hoje a cantina oferece alimentação a todos que necessitam. Quando acontece alguma festividade na aldeia é lá que tudo acontece.











Guilherme JaberPostado por Guilherme Jaber

Neste blog mostro um pouco de meu trabalho voluntário que faço na Aldeia de Brackuy em Angra dos Reis com índios da etnia Guarani Mibia. Meu trabalho consiste em ensinar a eles maneiras alternativas de construção de moradias sem agredir o meio ambiente. Para mais detalhes sobre esse trabalho... Entre em Contato

Obrigado


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